terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Ave de Prata - Zé Ramalho





É muito mais do que muito
Muito mais do que quantos anos todos piorei
É muito mais do que mata
Muito mais do que morrem todos pela planta do pé
É muito mais do que fera
Mais do que bicho quando quer procriar
Uma espécie, sementes da água, mistérios da luz
Émuito mais do que antes
Mais do que vinte anos multiplicar
Dividir a mentira
Entre cabelos, olhos e furacões
Inventar objetos
Pela esfinge quando era mulher
Ave de prata
Veneno de fogo
Vaga-lume do mar
O mar que se acaba na areia
Gemidos da terra apoiados no chão
Entre todos que usam os dentes do arpão
Apoiados em cada parede pela mão
Pela mão que criou tantas trevas e luz
e cada coisa perdida
Perdidamente pode se apaixonar
Pela última vida
Poucos amigos hão de te procurar
Como é o silêncio?
E nesse momento, tudo deve calar
numa história que venha do povo
O juízo final

Um comentário:

Chay Fernandes disse...

Conheci a música através do Felipe Catto, mas o tom apocalíptico me pareceu algo tão mais antigo e também familiar. Não foi surpresa quando descobri que a música é do Zé ramalho.

Estava a procura de algo que retratasse essa minha agonia de fim de ano. Agonia sobre a realidade (relativa e sistemática). A falta de paciência por ter que esperar o tempo dos outros. A dor de abandonar os antigos costumes como se estivesse trocando de pele.

E no fim eu sei que terei que engolir e digerir a antiga casca, por que o passado nunca deixará de fazer parte de mim.